Por vezes temos crenças e comportamentos, que têm por objetivo proteger-nos, mas que, a longo-prazo, acabam por nos trazer mais sofrimento. A título de exemplo, podemos pensar na pessoa que se preocupa constantemente com o pior cenário possível a fim de o evitar ou de se preparar para lidar com ele.
A perspetiva de mudança pode gerar ambivalência, pois significa abandonar o desconforto que já nos é familiar e avançar para um campo desconhecido. Não devemos anular ou ignorar a ambivalência. Pelo contrário devemos reconhecê-la e explorar o que poderá estar subjacente a tal conflito interior, a fim de potenciar um compromisso sólido com a mudança e diminuir a procrastinação.
O método mais simples para lidar com a ambivalência consiste em analisar os prós e contras de permanecer igual versus alterar os nossos padrões de funcionamento disfuncionais. Sem tomar partido por um dos lados, é importante compreender e validar as nossas múltiplas motivações e barreiras (por vezes contraditórias) que nos impedem de avançar. Podemos criar uma matriz de quatro quadrados que mostre as vantagens e desvantagens de fazer uma mudança, bem como as vantagens e desvantagens de não fazer a mudança. Consequentemente é importante que os contras dos nossos padrões disfuncionais ultrapassem suficientemente os prós para que todo este trabalho árduo valha a pena. Para tal, é necessário encarar os nossos maus hábitos como algo simultaneamente reconfortante a curto prazo e prejudicial a longo prazo.
Waller e colaboradores (2010), no seu livro de autoajuda sobre Perturbações do Comportamento Alimentar (intitulado Beating your eating disorder: A cognitive-behavioral self-help guide for adult sufferers and their carers), fazem uma analogia que pode ser importante ter presente:
Os teus [padrões disfuncionais] são como uma camisola barata. Quando a vestes pela primeira vez, mantém-te quente e confortável. No entanto, não é feita de lã muito boa e, por isso, ao fim de algum tempo começa a fazer comichão. Por vezes, apetece-te tirá-la, mas sabes que, se o fizeres, vais ter frio, por isso aguentas a comichão. Com o tempo, porém, a comichão torna-se cada vez mais difícil de tolerar. A camisola torna-se cada vez mais desconfortável e, embora continue a manter-te quente, começas a pensar se não haverá melhores formas de te manteres quente. Se decidires que chegou a altura de tirar a camisola, é importante explorar primeiro as outras formas de te manteres quente (o estado de “planeamento” da mudança). No entanto, a dada altura, terás de tirar a camisola que faz comichão e ficar com frio durante algum tempo, enquanto experimentas outras formas de te manteres quente. Isto pode ser mais desconfortável a curto-prazo, mas a longo-prazo permitir-te-á manteres-te quente sem comichão. Se, de momento, não te sentes capaz de alterar os teus [padrões disfuncionais], isso pode dever-se ao facto de a camisola ainda não ter provocado comichão suficiente para que queiras arriscar ter frio. Se for esse o caso, poderás ter de continuar a usar a camisola durante mais algum tempo. Ao mesmo tempo, no entanto, pode ser útil explorar outras formas de te manteres quente – talvez aquelas que podes praticar enquanto continuas a usar a camisola que faz comichão.
Em suma, mudar pode ser um percurso complexo. Mesmo quando acreditamos desejar muito uma mudança, podemos deparar-nos com lentidão, recaídas ou autossabotagem. Isto pode ser um sinal de ambivalência. É natural que haja oscilações na nossa motivação para a mudança, e que o caminho esteja repleto de solavancos e avanços. Ainda assim, todos os dias são recomeços, pelo que será valioso centrar-nos no que ainda poderá vir a ser, em vez de no que poderia ter sido.