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E quando temos que institucionalizar os nossos pais?

Os tempos mudaram, no passado tínhamos várias gerações na constituição do agregado familiar, hoje temos duas ou menos! Temos ainda anciões que pertencem a uma época em que se cuidava e morria em casa, realidade esta que nos parece muito distante!

Com a entrada da mulher no mercado de trabalho, o afastamento geográfico devido à atividade profissional, crianças e jovens cada vez menos tempo em casa (pelas atividades curriculares e extra-curriculares), a distância entre familiares, entre outros motivos, e o surgimento das estruturas residenciais para idosos (conhecidas como lares), levou a uma mudança no cuidar dos mais velhos. Os lares são cada vez mais um recurso ao qual as famílias recorrem quando um familiar adulto/idoso, apresenta um grau de dependência física e/ou mental que impossibilita a sua permanência em casa sozinho, bem como a sua autonomia nas atividades de vida diária e atividades instrumentais. São diversos os estudos que abordam, e bem, o impacto físico, emocional e cognitivo, da institucionalização nas pessoas mais velhas com diferentes estádios de dependência.

E nas famílias? Qual é o impacto da institucionalização?

Sabemos, infelizmente, que mais vezes do que deveria acontecer, os lares funcionam quase como um “depósito de velhos”, que existem famílias que após a institucionalização se afastam completamente física e afectivamente. Mas e as outras famílias? Que recorrem à institucionalização por não terem outra resposta, seja pela ausência de familiares em casa por longos períodos de tempo, seja pelo impacto financeiro que tem nas famílias ao contratar um cuidador formal para ficar em casa, seja por tudo o que implica o cuidar, 24 horas sob 24 horas, uma pessoa com dependência grave, ou por outros motivos igualmente plausíveis. É fundamental estar alerta a estas famílias que vivenciam emoções intensas de impotência, frustração, culpa, tristeza, fracasso e abandono dos seus familiares. Emoções que quando não são devidamente trabalhadas podem ser fatores de risco não só no que respeita a problemas do foro emocional, mas também nos lutos prolongados e complicados.

É importante estar atento a:

– Familiares que experienciam sintomas de distress (stress negativo) após ou antes da visita;

– Narrativas de culpabilização e medo de não vir a ser perdoado pela pessoa institucionalizada;

– Manifestações de revolta contra si próprio, por não ter outro tipo de resposta ou não poder cuidar;

– Dificuldade em dormir ou comer (ou fazê-lo em excesso) para gerir o distress da visita;

– Modificação dos hábitos de autocuidado, após a institucionalização;

– Dificuldades em delegar cuidados e confiar na equipa do lar;

– Sentimentos de estar a abandonar o familiar no lar;

– Medo de ser castigado por não cuidar dos seus pais, como era habitual na sua família;

– Evitar as visitas ou fazê-las por um curto período de tempo, devido a medos associados à reação da pessoa institucionalizada;

– Sentir-se obrigado ou pressionado a institucionalizar os pais por decisão de outros elementos da família;

– Outros sinais que os profissionais que contactem regularmente com a família identifiquem como preocupantes.

 

O que podemos fazer, nós profissionais e sociedade no geral?

  • Não fazer juízos de valor, pois não conhecemos todo o contexto e não sabemos o que motivou a institucionalização;
  • Proporcionar a família a participação em algumas rotinas da pessoa institucionalizada;
  • Tranquilizar a família, a pessoa institucionalizada não deixará de fazer parte da sua família, podem ir buscá-la para passar o fim de semana, um dia, uma parte do dia (sempre que a condição clínica da pessoa o permita);
  • Incentivar e facilitar a participação da pessoa institucionalizada nas festividades em família;
  • Desmistificar crenças erradas que possam surgir e provocar sofrimento;
  • Devemos estar atentos e mostrarmo-nos empáticos face a alguma manifestação dos pontos acima mencionados;
  • Aconselhar a família a procurar ajuda profissional quando o impacto emocional começar a interferir com o funcionamento pessoal, social e profissional e/ou com a dinâmica familiar.

Por fim, importa salientar a importância de acolher e validar as manifestações da família, facilitar a expressão das mesmas e ajudar a família a encontrar estratégias que visem a diminuição do sofrimento experienciado. Realçar que cada família tem toda uma história, tornando-a única e com as suas próprias especificidades, pelo que deve ser tratada com respeito, empatia, tolerância e compaixão.

 

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