Nos tempos que correm, é comum ouvirmos falar, com frequência, de “narcisismo“, seja nas redes sociais, nas relações amorosas, nas relações familiares, ou até no ambiente de trabalho. Mas o que é, de facto, o narcisismo? Quando é que os traços narcisistas evoluem para uma perturbação? Porque é que nem todos os narcisistas são iguais?
O termo remonta à mitologia grega, fazendo referência a Narciso, um jovem que se apaixonou pelo seu próprio reflexo. Na Psicologia, o narcisismo constitui um traço de personalidade que pode estar presente em diferentes graus – desde uma autoestima saudável até uma Perturbação Narcisista da Personalidade (PNP), quando há um impacto significativo destes traços na vida do indivíduo e de quem com ele convive.
De acordo com o Manual Diagnóstico e Estatístico das Perturbações Mentais, 5ª Edição (DSM-5), a PNP é caracterizada por um padrão persistente de grandiosidade, necessidade de admiração excessiva e falta de empatia. Alguns dos critérios incluem:
- Sentimento de superioridade e de que se é especial, muitas vezes de forma exagerada e infundada;
- Fantasias de sucesso ilimitado, poder, beleza ou amor ideal;
- Exploração dos outros para alcançar os próprios objetivo;
- Inveja, arrogância e altivez;
- Dificuldade em aceitar críticas;
- Necessidade de ser incondicionalmente admirado;
- Procura constante de atenção.
Não obstante, o narcisismo pode manifestar-se de várias formas. Além do narcisismo “clássico” ou grandioso, estudos mais recentes apontam para diferentes subtipos com características distintas, que têm sido explorados por vários autores ao longo da história da Psicologia.
1.Narcisismo Grandioso
O mais visível: arrogante, dominador, que procura destaque e poder. Muitas vezes confundido com autoconfiança, mas há uma necessidade constante de validação. Este é o tipo de narcisismo tradicionalmente descrito por Otto Kernberg, e também pelo DSM-5. Kernberg associa estes traços a um funcionamento de personalidade mais superficial, pautado por comportamentos manipuladores e autoestima extremamente elevada.
2. Narcisismo Vulnerável (ou Encoberto)
Menos percetível, igualmente problemático. O indivíduo com narcisismo vulnerável ou encoberto poderá parecer inseguro, hipersensível à crítica e emocionalmente instável. Por trás disso, possui uma autoestima frágil e uma intensa necessidade de reconhecimento, mas tem medo de se expor. Este subtipo foi discutido Heinz Kohut, no âmbito da Psicologia do Self, e mais recentemente validada por Pincus e Lukowitsky (2010), que propuseram um modelo bifatorial de narcisismo: grandioso versus vulnerável.
3. Narcisismo Maligno
O mais destrutivo. Combina características do narcisismo grandioso com traços paranoides, sádicos e antissociais. Pode haver manipulação intensa, frieza emocional e prazer em controlar ou humilhar os outros. O termo foi inicialmente introduzido por Erich Fromm e posteriormente expandido por Kernberg, que relaciona este subtipo a uma organização de personalidade ainda mais patológica, próxima da Perturbação Antissocial da Personalidade.
Em suma, apesar da aparência de superioridade, o narcisismo patológico frequentemente esconde sentimentos profundos de insegurança, fragilidade emocional e medo da rejeição. Muitas vezes, tais defesas são resultado da exposição a contextos de negligência, crítica excessiva, ou idealização na infância.
Identificar os diferentes tipos de narcisismo é essencial, não apenas para um diagnóstico mais preciso, mas também para orientar intervenções que favoreçam vínculos mais equilibrados e uma autoestima mais estável.