Quantas vezes já deu por si a criticar-se quando se apercebeu que falhou de alguma forma, que errou ou quando fez algo que não correspondeu às suas expetativas? Quantas vezes deu por si a proferir frases autodirecionadas como “não fazes nada de jeito” ou “és mesmo estúpido”? Ou a comparar-se negativamente com os outros e a dizer para si “porque é que eu não sou tão inteligente como ele”?
A verdade é que, fazemos isto (achamos nós), com o intuito de nos protegermos, de nos adequarmos e fazermos diferente de uma próxima vez, para “aprendermos”. Mas... será que é isso que se verifica? Pode parecer, numa primeira instância, uma estratégia adaptativa, mas quando somos excessivamente autocríticos não raras vezes entramos num loop de pensamentos negativos, associados a sentimentos de inadequação e desajuste e, consequentemente, níveis de angústia, frustração e insatisfação elevados, ativando um círculo vicioso onde nem sempre parece fácil sair. Podemos sentir-nos destruídos.
E se experimentássemos outra postura? Se nos permitíssemos a parar, reconhecer o “erro” e a adotar uma postura mais autocompassiva?
Mas o que é que é isso de se ser autocompassivo?
A compaixão trata-se do reconhecimento do sofrimento do outro e na tentativa de o aliviar de alguma forma. Assim, a autocompaixão trata-se da capacidade de adotarmos uma postura gentil e compreensiva para com o nosso sofrimento, vivendo as experiências de uma forma consciente e equilibrada, reconhecendo a falibilidade do ser humano, conectando-nos uns com os outros.
E como posso pô-la em prática?
Primeiro, é importante estarmos conscientes do nosso diálogo interno. Uma forma de verificarmos se esta postura autocrítica é “natural” em nós é recordarmos um episódio embaraçoso, em que nos tenhamos sentido desadequados e insatisfeitos connosco próprios. Depois, vamos estar atentos àquilo que a nossa mente nos está a dizer. Podemos tomar nota disso mesmo. Agora vamos imaginar que é um amigo/familiar nosso que está a viver esse episódio difícil. O que lhe diríamos? Será que somos tão duros e intransigentes com essa pessoa como somos connosco?
Conseguimos notar alguma diferença no trato? Na postura? No tom de voz?
A verdade é que temos uma grande tendência para tratar o sofrimento do outro com bondade na tentativa de o ajudar, de aliviar a sua dor… Connosco a postura já costuma ser outra, em que a punição e o criticismo ganham relevo.
Se realmente notamos essa diferença, talvez a adotemos com alguma frequência no nosso dia-a-dia e nem tenhamos consciência disso... Por vezes esta postura autocrítica vem desde “sempre”, está enraizada em nós e faz com que sintamos solidão e tristeza porque a inadequação é uma constante e não temos a capacidade de nos “ampararmos”.
De uma próxima vez, quando der por si num momento de sofrimento e inadequação, talvez possa pensar “como trataria uma pessoa de quem gosto nesta situação?” e talvez possa ajustar a sua postura e perceber como se sente.
A parte positiva de tudo isto é que a autocompaixão é um construto passível de ser trabalhado, nomeadamente num processo psicoterapêutico. Pode ser importante parar para perceber de onde vem essa voz crítica e perceber como alterá-la. Para viver uma vida mais consciente e mais leve.
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