Estamos no Natal. Rito de origem cristã, tão impregnado na nossa cultura que até as famílias não religiosas o celebram. Todos os anos, nesta época, vemos com frequência as crianças comentarem como se devem comportar porque são "espiadas" por um sujeito designado de Pai Natal que vê tudo o que se passa, pois têm nas mãos algo muito precioso para os nossos filhos: presentes.
As frases que giram em torno do Pai Natal que observa e julga o comportamento das crianças em deixar presentes ou não, são mensagens de chantagem tremendamente poderosas que buscam modificar o comportamento da criança sob uma ameaça disfarçada.
Mas, ao lançar esse tipo de mensagem na criança, não "apenas" fazemos com que ela aja por medo e submissão (e não por responsabilidade), mas também pode causar danos à sua autoestima e confiança, humilhação, sentimento de culpa, insegurança ou vergonha. O castigo é a melhor forma de desresponsabilizar uma criança. E porquê? Porque ela não é envolvida na situação, não aprende com ela nem lhe é dada a possibilidade de reparar o que fez.
O fato de usarmos esta personagem, do imaginário popular, tão amorosa e próxima, como instrumento de chantagem para os nossos filhos, explica-se muitas vezes pela nossa falta de autoridade e recursos que nos leva a ter que recorrer a alguém para exercer a nossa autoridade.
Então, a questão é: como podemos fazer?
Acompanhando. A criança aprende quando é acompanhada. Não garante que ela tenha comportamentos adequados o tempo todo, mas é justamente nesses momentos que temos a melhor oportunidade para ensinar a fazer melhor na próxima vez.
As crianças precisam aprender que tudo o que fazemos tem consequências para os outros, e essas consequências devem ser muito mais importantes do que ter ou não presentes no Natal. Ou seja, se condicionarmos o comportamento da criança aos presentes que recebe, ela nunca aprenderá as reais consequências de seus atos, não identificará os seus erros e, portanto, é importante descodificar a nossa frase usual "porta-te bem" e explicar de uma forma simples e clara o que esperamos que seja o comportamento. Por exemplo: “aproveita muito o teu dia na escola hoje! Fica atento a tudo o que o professor fala e pede para poderes aprender muito. Brinca o máximo que puderes ao intervalo e diverte-te com os teus amigos”.
Os presentes são ofertas, lembranças, que servem para transmitir amor, generosidade e gratidão. Damos presente aos nossos filhos porque isso nos faz feliz e os faz felizes, assim como fazemos com os nossos amigos ou os nossos parceiros. Não dizemos a nenhum deles que, se não "se portarem bem", não lhes daremos um presente de Natal.
O Natal é uma boa altura, embora não a única, para fazer um exercício de gratidão, expressar o quanto gratos estamos pelo que a vida nos dá, embora nem sempre nos portemos bem, dando mais ênfase ao que temos e não tanto ao que nos falta. Sejamos um exemplo sem necessidade de chantagens, turvando a magia de uma noite que é ilusão e alegria e que certamente tingirá de ternura as memórias dos nossos filhos.
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