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30 Primaveras e uma tempestade

Atualizado: 30 de mai. de 2023

A vida acontece a cada momento. O tempo avança, somam-se dias, semanas, meses, anos. Para todos nós há um dia do ano em que o número que define a nossa idade se altera. Todos os anos, no dia em que nascemos, acrescentamos um número ao contador da nossa existência. Para alguns esta mudança passa despercebida, para outros nem tanto. Talvez porque nem todos os anos sentimos que acrescentámos à nossa vida o que planeámos e idealizámos. Talvez porque cada vez o comboio parece andar depressa de mais.


Contudo, há números que, nesta luta contra o avançar do tempo, têm sofrido mais alarido e uma maior pressão da sociedade. Em terapia aparecem pessoas com questões que refletem como os 30 têm vindo a ser encarados como uma viragem para aquela fase de vida onde se espera ter tudo, onde acontece tudo mas onde já é suposto entrar com meio caminho feito. Caso contrário, soam os alarmes: estás atrasado/a! Muita da pressão associada aos 30 anos relaciona-se com as famosas checklists da sociedade que por essa altura deveriam estar cumpridas, ou pelo menos quase: “Já subiste na carreira? Olha que a partir de agora fica difícil! Já casaste? Tens namorado/a? E os filhos? Olha que já não tens muito tempo! Comprar casa, mudar de emprego? Ou é agora ou nunca!”. Isto, e outras coisas, dizem muitas vezes as almas inquietas, com as vidas dos outros e os ritmos de cada um. Com esta pressão surgem muitas vezes sentimentos de ansiedade, angústia, insegurança e inferioridade com base na comparação com outros. É verdade que podemos ter idealizado onde é que queríamos estar aos 30. Também é verdade que quando lá chegarmos há uma grande possibilidade de estar tudo do avesso, principalmente com o contexto social, profissional e económico dos últimos tempos. Para não falar nas relações, que estão em crise. E no amor, que às tantas nas voltas da vida perdemos a noção do que é e do que não é. Portanto, 30 primaveras e na mente uma tempestade de preocupações, ansiedade e tristeza.


Quando aquelas vozes ficam a ecoar na mente de quem as ouve, começa a inquietação:“E agora? Entro nos 30 com a vida do avesso? Aceito menos do que mereço e idealizei porque mais vale isso e uma tarefa cumprida do que nada? Ah e não te esqueças que tens pouco tempo!” Este novelo de pontos de interrogação cai em várias armadilhas mentais: primeiro, ninguém sabe quanto tempo tem. Segundo, o tempo não é igual para todos, os ritmos não são os mesmos, nem tão pouco os objetivos. Não precisamos de pensar muito para percebermos que raramente se pergunta “estás feliz com 30 anos?”. Mas não deveria ser isso que importa?

E se a vida está do avesso e não tens tudo o que querias e precisas quando lá chegas, o que é que isso significa? O que é que diz sobre ti? Falhaste? Estás longe de ser bem-sucedido/a, feliz ou completo/a? Ou estás só a fazer o melhor que sabes no teu caminho? A vida do avesso também se vive. Provavelmente vamos senti-la assim a maior parte do tempo, porque é incerta, imprevisível e não está sempre no nosso controlo. Pensando melhor, talvez a vida só se viva do avesso. Porque esperar viver no lado certo e numa linha contínua sem obstáculos é irrealista, para além de bastante aborrecido. Será que algum dia vamos ter tudo o que desejámos quando chegar “aquele” aniversário? E se esse dia chegar, o que faremos a seguir? Provavelmente procuramos a próxima pressão da sociedade para corresponder, voltamos a sentir-nos insatisfeitos e a tempestade (re)começa. Queremos mais, sempre mais. E vamos à procura, enquanto nos distraímos da nossa essência, de quem somos e do que nos preenche. E na próxima volta ao sol lá estaremos, às voltas na alma e no coração com tudo o que gostávamos de ter vivido. A vida é um caminho, não um resultado. Não julgues o teu caminho, pois daí só resulta angústia, arrependimento e ressentimento. Seja aos 30, 40 ou 50, pergunta-te o que sentes no sítio onde estás e para onde queres seguir.



“É tão fácil comparar a vida a uma viagem. Faz tanto sentido. Viagem ou vida, chegamos sempre aqui. Como se estivéssemos no alto de uma montanha, podemos olhar em volta. Aqui é o lugar onde tudo acontece. Há serenidade nesta certeza. Tens o dever livre de aproveitá-la. Se estás a ler estas palavras é porque estás vivo.” – José Luís Peixoto


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